domingo, 22 de fevereiro de 2015

Os Fantasmas Que Eu Vejo



                    



       Eu vejo o mundo como uma coisa grande. Uma coisa muito grande e física. Mas eu sei que esta é uma pequena parte do que ele é. Eu vejo o mundo como uma coisa que está viva e que é assim que ele consegue gerar vidas.

       Então eu penso que se algo assim tão grande está vivo, é de se esperar que tenha uma alma enorme também. O Espaço que fica onde não há amor é preenchido pelo ódio, que patrocina as guerras, as injustiças e desigualdades sociais. E isto fere o mundo. E o mundo ferido sangra. O mundo sangra espíritos. Esses espíritos são os fantasmas que eu vejo.

                   

                        

sábado, 15 de novembro de 2014

Pressa?

      
      
       Não me venha com essa conversa de aproveitarmos ao máximo as oportunidades que surgem. De tentarmos ser felizes e nos agarramos às chances surgidas, simplesmente porque a vida está passando rápido e temos que correr contra o tempo para sermos felizes.
       
       Não, não é por aí. Se eu tiver que viver segurando um cronômetro, eu simplesmente paro. Porque as oportunidades surgidas, bem como as chances de aproveitarmos o tempo não podem ter um prazo definido.
 
       Para mim o amor tem de ser vivido após um planejamento para ser eterno. Quero aproveitar as oportunidades assim como viver um amor já pensando em mais e mais.
Eu não vejo o durante como uma justificativa para o que pode ser um fim.
 
       Não. O meu orgasmo eu começo a sentir quando você se permite sustentar o meu olhar. E não será ninguém mais, além
de você, que renascerá em cada minuto que vivermos juntos sem a preocupação de saber em que estágio o tempo resolveu se colocar..."

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Resignação



Às vezes eu me empolgo e tento dividir coisas que se mostram importantes apenas para mim. Valores nobilitantes não se sustentam na necessidade de esquecer o passado, o que nos proporciona um pouco de tranquilidade e condições para vivermos de forma construtiva e digna. Chega um momento da vida em que ter um cachorrinho pra ser seu amigo já é uma dádiva. Mas nem sempre você pode ter. E você se resigna.


Que malditas essas correntes que nos impedem de ser feliz, fétida masmorra onde são jogadas migalhas de felicidade. O vento varre a alameda cheia de nada e você  vê surgir a prostituta, velha e triste, que sem levantar os olhos segura o vestido para não subir com o vento. A condição nesse momento te leva a lona e você se questiona pelo que há dentro de nós. Um cão que lhe mostra os dentes e você insiste em afagar. A partir daí não importa a falta de importância que tudo isso terá para as pessoas uma vez que você está certo de que alguém não desprezou o que ficou subentendido.

 

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Os Carros do Caco


 

                             Os Carros do Caco

       Ainda pré adolescente ele foi manchete de um jornal sensacionalista da região devido a um acidente de carro. O Diário trouxe estampado na primeira página a reportagem que contava como um menino de doze anos pegou, escondido, o carro do pai e foi dar uma volta na praia que ficava próxima da sua casa.

       O menino iniciou a descida pela rua que dava acesso à avenida que contornava a praia e perdendo o controle do carro que parecia não ter freios, foi pegando cada vez mais velocidade indo parar, literalmente, nas areias da praia. Isso depois de uma capotada que ultrapassou a restinga, como se ela não existisse. Saiu do carro sem um arranhão e voltou correndo pra casa, assustado, mas sem fugir da responsabilidade pediu a ajuda dos irmãos para resgatar o veículo.

       Com dezesseis anos o menino continuava com pressa e convidou a amiguinha de quinze para ser a sua mulher. Iriam ficar juntos por vinte e oito anos.

       Com dezoito já comandava barcos de pesca industrial com excelente performance e tinha dois filhos. Um deles lhe daria uma netinha que herdaria os seus olhos.

       A sua relação com carros era algo curioso. Perdeu vários por acidentes no trânsito, teve um recém comprado que explodiu na frente de casa tão logo ele havia saído, no entanto sem condições de fazer qualquer coisa que pudesse evitar a perda total.

     


      
 Conseguiu adquirir um carro novo, que para enaltecer sua relação vale o registro da placa: XXX 2503. E como tudo na sua vida aconteceu rápido, a sua vida aqui também passou muito rápido quando o seu coração parou de bater enquanto ele dormia na noite de 25/03.

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

O Mestre

 
       O verão aos poucos dava lugar ao outono. A noite quente e silenciosa prenunciava uma alteração brusca no tempo, mas o que ninguém esperava era que aquela tempestade que se aproximava fosse tão forte ao ponto de a pequena embarcação não conseguir se sustentar, mesmo com duas âncoras na água, sendo arrastada como se nada fosse diante daquele arrombo da natureza.

       Foi preciso partir os motores e se manter de encontro ao forte vento para que a sensação de um pouco de segurança ajudasse os seis tripulantes a passarem aquelas angustiantes horas.
Pouco se falava. Os que sabiam rezar, elevavam os seus pensamentos aos céus pedindo que aquela agonia não se estendesse por tanto tempo. Os mais experientes confortavam os demais dizendo que tudo aquilo fazia parte da vida do pescador.

       O barulho das ondas de encontro aos vidros do casario se misturava com a estática do rádio onde, entre ruídos desconexos e lampejos de alguma clareza era possível ouvir que alguém pedia socorro.
Num único movimento todos se juntaram ao mestre que tentava sintonizar o rádio da melhor maneira possível para em seguida ouvir a mensagem que vinha de uma corveta da Marinha do Brasil, que repetidamente dizia:

       “Atenção todas as embarcações que se encontram nas imediações pois recebemos pedido de socorro de um IATE, com seis pessoas da mesma família a bordo, a deriva, sem máquinas a tantos graus de latitude com tantos graus de longitude etc., etc.. sendo que se alguém se encontra próximo em condições de ajudar, por favor reporte-nos.”

       Nesse momento, o comandante Sergio, ali mesmo em cima da cama estendeu a carta náutica e sem nenhuma dificuldade identifica o exato local onde supostamente encontrava-se o iate e para surpresa dos demais tripulantes , com o dedo apontando um determinado ponto da carta ele diz:         “... eles estão aqui e nós estamos aqui, recolham as âncoras, nós vamos buscar essa família.

       Um pouco atônitos mas sem duvidar de seu mestre os tripulantes apenas esperaram para ouvir o que dizia o seu Dico, cozinheiro e pessoa mais velha da tripulação. “Sergio, sem querer tirar a tua autoridade, mas como sou eu quem despacha este barco como mestre, mesmo sendo você o comandante, não seria mais prudente nós esperarmos a tempestade passar assim como os demais barcos estão fazendo?” E ele retrucou. “Seu Dico, uma embarcação sem máquinas, a deriva nesta tempestade pode não ter muito tempo e nós vamos buscá-los agora” disse, ao tempo em que se dirigia ao rádio e avisava a corveta da Marinha: “Atento, atento (...) aqui o pesqueiro (...) indo ao encontro da embarcação (...).

            Em poucas horas, para alegria de todos se aproximaram do iate que se encontrava atravessado na maré com seis pessoas desesperadas a bordo. Rapidamente um cabo foi lançado, amarrado e o reboque teve início sob gritos de delírios e alegria das duas tripulações. Enfrentaram, ainda, muitas ondas e ventos próprios da grande tempestade que era mas finalmente puderam encontrar com a corveta que calmamente se aproximou e enquanto os marinheiros recebiam o cabo de reboque, o capitão trocou algumas palavras com o mestre, de passadiço à passadiço agradecendo e informando que o mesmo deveria comparecer no dia seguinte à Capitania dos Portos para registrar o laudo do ocorrido.

       Assim foi feito e após atracarem no cais da Capitania, Sergio pediu para seu Dico, na qualidade de Mestre oficial da embarcação se apresentasse perante ao Capitão dos Portos. Ao cabo de algumas horas, seu Dico retorna dizendo que sentia muito mas o comandante da corveta não o reconhecera como o mestre que fizera a manobra de entrega do iate resgatado no dia anterior.

       Sem contar tempo Sergio se apresentou ao Capitão e então esclareceu que não tinha ido antes porque, na verdade, apesar dele comandar o barco o mestre era outro porque ele não tinha carta de habilitação para exercer a função, pois apesar de estar na pesca desde os seus dezesseis anos contava, agora, com pouco mais de vinte e ainda não havia feito os cursos e portanto não tinha carta de  mestre.

O Capitão dos Portos, então, lhe disse: “Você falou certo: você não TINHA carta pois a partir de agora você conquistou, por bravura e competência a CARTA DE PATRÃO DE PESCA DE ALTO MAR, categoria equivalente a MESTRE DE CABOTAGEM DA MARINHA MERCANTE DO BRASIL, não havendo necessidade de provar mais nada quanto a sua habilidade.

       Foi assim que o filho do seu Tilo ou o Serginho da dona Bia tornou-se um dos melhores Mestre de Barcos da costa brasileira chegando a atuar com grande eficiência nos mares da República Uruguaia, aportando em La Paloma por vários anos consecutivos com grande sucesso.

Esta é uma das fantásticas histórias de meu irmão, o Caco, que no dia 25/03/2011 depois de despedir-se de alguns amigos quando contava da sua maravilhosa fase da vida, foi dormir, feliz e em paz nos seus 44 anos e não mais acordou para esta vida.




Já Foi Pior...



       Igual a um cão fuçando na lata de lixo atrás de uma migalha de sobrevida, eu me peguei revirando a minha mente em busca de algum lugar no passado onde eu ainda podia rir de minhas piadas, onde a vida não havia ainda dado lugar a morte, quando o motivo do riso ainda era a própria vida.

           O cão, agora, recolhe-se a um canto, sozinho, onde lambe as próprias feridas. Foi pior. Ele já rogou por um tiro de misericórdia. Não foi difícil, não estava muito longe a imagem, pois mesmo antes de mais uma lágrima procurar o contorno do seu rosto ele podia ver e ouvir sua mãe ainda dizer que um menino não chora.

 

Máscara




MÁSCARA
      Impossível fugir do clichê dizendo que todos nós usamos máscaras.. é que são tantas as máscaras que acabamos nos acostumando, tanto, que nem percebemos as diferentes faces que elas nos emprestam. Tampouco podemos distinguir um lobo no meio do rebanho.
       Teremos que, constantemente, nos proteger de nós mesmos?
       Algumas chegam a nos dar calafrios, outras nos são motivos de orgulho; algumas nos dão alegria, outras tantas mal reconhecemos; algumas nos foram impostas, outras nós mesmos criamos.. Elas representam todos os nossos medos e ao mesmo tempo em que se apresentam como um elemento inspirador elas podem enfraquecer-nos.
       Mas o difícil mesmo é descobrir com qual delas mais nos identificamos. E viajamos, então, para dentro de nós mesmos, numa busca infinita de um encontro que está marcado sem data nem local exatos.. mas está marcado.

       Para a garantia da sobrevivência eu vejo como indispensável o uso de máscaras. O líder não deixa de ser a máscara da massa.

       Tu me desejas. E um dia maravilhoso, posso até ter, mas sem máscaras sei que será impossível. A liberdade que me é tão cara pode estar condicionada a essa máscara mais contumaz, que de meu uso costumeira se fez. Ou se faz.

        Em fim, nos emprestarmos para essas máscaras é normal. O que me preocupa é quando usamos as máscaras para nós mesmos.